Ministério Público de Santa Catarina abriu um procedimento para investigar informações de possíveis irregularidades em quatro transferências de pacientes com Covid-19 da rede privada para a rede pública em Chapecó, no Oeste catarinense, informou o promotor de justiça Felipe Schmidt ao G1.
“Temos uma auditoria que constatou que, em tese, teria ocorrido a migração destes quatro casos de forma irregular. Estamos agora ouvindo os prestadores de serviços envolvidos, públicos e privados, para saber o que e como aconteceu. Estamos apurando em que condições ocorreu a transferência destes pacientes”, disse o promotor.
Segundo um relatório feito pela auditoria da Secretaria de Saúde do município no dia 12 de abril, após esses quatro os pacientes declararem ‘hipossuficiência financeira’, ou seja impossibilidade de arcar com as despesas de uma internação na rede privada, houve a aprovação da reserva de vaga, por meio da Central Estadual de Regulação, em um leito do Hospital Regional do Oeste (HRO), que é público.
Todos os quatro pacientes permanecem internados na unidade pública, segundo o relatório da auditoria. Felipe explica que as transferências entre pacientes da rede pública e privada acontecem de forma recorrente, mas ele afirma que estes pacientes não devem ser priorizados no Serviço Sistema Único de Saúde (SUS).
“Por exemplo, a pessoa foi fazer uma cirurgia no atendimento privado, mas pode ter acontecido algo e ela precisou fazer uma nova cirurgia, mas agora não tem mais dinheiro para arcar. Ele vai querer migrar para o SUS, mas ela terá que voltar para a porta de entrada, não pode furar a fila”, explica.
Contudo, a auditoria feita em Chapecó mostrou que no mesmo período da habilitação dos leitos para os pacientes que provinham do sistema privado, havia pacientes do sistema público aguardado por uma vaga de leito na mesma unidade.
O Ministério Público instaurou o procedimento no dia 12 de abril e notificou o Hospital Unimed de Chapecó, o Hospital Regional do Oeste e a Secretaria de Estado da Saúde para o oferecimento de informações sobre as transferências. Os envolvidos têm até o começo do mês de maio para oferecer as informações solicitadas pelo órgão.
Em nota, a Secretaria de Estado da Saúde disse que prestará os esclarecimentos necessários ao MPSC no prazo assinalado.
Também procurados pelo G1 SC, o Hospital Unimed Chapecó e o Hospital Regional do Oeste (HRO) informaram que s esclarecimentos serão passados ao MPSC.
Auditoria
A auditoria realizada pela Secretaria de Saúde de Chapecó, levantou informações sobre quatro pacientes que procuraram atendimento inicial em um hospital privado com quadro respiratório suspeito ou confirmado de Covid-19.
Posteriormente, os pacientes apresentaram uma piora no quadro clínico tendo como orientação médica a sua internação em um leito da Unidade de Terapia Intensiva (UTI) da unidade. Contudo, esses pacientes declararam que não teriam condições de arcar com os custos da operação.
No relatório da auditoria consta, que neste momento, a unidade privada realizou o trâmite da transferência dos pacientes para o Hospital Regional do Oeste, que é público. A transferência foi aceita, sem questionamentos pela Gestão Estadual de Regulação da Secretaria de Estado da Saúde.
O documento afirma que nos dias 10 e 17 de março e 5 de abril a Central de Regulação de Internação Hospitalar de Chapecó ofertou quatro leitos para esses pacientes que não provinham do SUS.
Em pelo menos dois casos, a auditoria mostrou que, quando uma vaga da UTI foi aberta do HRO, o paciente da rede particular foi transferido. As transferências nestes dois casos teriam acontecido, segundo o documento, através do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência(Samu).
“Quando aberto UTI Ala 6 no HRO para suprir demanda de 101 pacientes do SUS aguardando vaga, foi ofertado e reservado leito a essa paciente que já estava em leito de UTI particular […] e transferido a paciente através do SAMU (que é para atender Inter hospitalar SUS, e estava sobrecarregado)”, cosnta no documento sobre a transferência de uma paciente de 57 anos.
O relatório aponta que o Hospital Regional do Oeste (HRO) tem 103 leitos e seis alas para a assistência especializada aos pacientes com Covid-19 e que na unidade “não há leitos para tratamento da infecção por Covid-19 reservados a pacientes particulares ou de convênio, sendo essa assistência prestada exclusivamente através do SUS”.
Na conclusão do documento, a auditora reforça que o Sistema Único de Saúde (SUS) não tem como população-alvo pessoas com hipossuficiência financeira, “ao contrário é de acesso gratuito a todos que o procuram (princípio da universalidade), com assistência conforme sua necessidade (princípio da equidade)”.
Quando o relatório foi feito, Santa Catarina tinha 138 pacientes na fila de espera por UTI Covid
Transferências de pacientes
Para a professora departamento de clínica médica da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Mariângela Pincelli, a transferência entre pacientes da rede particular para o SUS é complexa e há múltiplos fatores envolvidos no aceite, como a disponibilidade de leito e as necessidades dos pacientes. Ela explica ainda que a regulação de leitos não funciona como uma fila por ordem de chegada.
“Esses pacientes [da rede privada] não são priorizados pois já se encontram em atendimento. Mas quando solicitam transferência também adentram o sistema regulatório e, quando as variáveis são atendidas, podem sim ser transferidos para leitos públicos aos quais também tem direito”, explicou Mariângela Pincelli.(Por G1/SC)