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Reforma administrativa do Executivo mira as despesas com a máquina pública

O presidente Jair Bolsonaro durante encontro com o autoproclamado presidente interino da Venezuela, Juan Guaidó, no Palácio do Planalto

A reforma administrativa do governo está pronta e só costuras políticas a impedem de ser apresentada e encaminhada ao Congresso. Nesta segunda-feira (18/11), ao fim da manhã, Bolsonaro disse que aguardava uma melhora do clima político a fim de aparar arestas e evitar uma rejeição prematura do Congresso. Ao fim do dia, afirmou que, nesta terça-feira (19/11), se encontrará com o ministro da Economia, Paulo Guedes, para discutir a matéria. Há, de acordo com o presidente, a possibilidade de a proposta ser apresentada a ele na reunião. Deixou claro, contudo, o objetivo de enviar a redação “mais suave possível”.

As informações analisadas pela equipe econômica para fundamentar a reforma administrativa apresentam, no entanto, um cenário preocupante. Sem uma reforma administrativa, a proporção da despesa com servidores públicos em relação ao Produto Interno Bruto (PIB) chegará a 14,8% em 2030. Atualmente, esse percentual é de 13,6%. É o que aponta um relatório elaborado pelo Ministério da Economia. O Correio obteve acesso ao documento, intitulado Menos Máquina, mais Social — Governo justo, eficiente e fraterno, uma espécie de exposição de motivos e de defesa da reforma administrativa em gestação pela equipe econômica.

O diagnóstico faz parte do chamado Plano mais Brasil — A Transformação do Estado, apresentado em 5 de novembro. O documento traz três grandes desafios: aumentar a capacidade de investimento do Estado e dar retorno para a sociedade; reduzir a complexidade e implementar uma gestão que coloque o serviço público na vanguarda; e aproximar o serviço público do cidadão, “uma vez que o Estado existe para servir à sociedade”.

Ao longo de 24 páginas, o relatório, baseado em dados de 2018, começa com uma radiografia das despesas. A equipe econômica expõe que a proporção das despesas com pessoal do setor público em relação ao PIB tende a saltar de 13,6% em 2018 para 14,8%, um aumento de 1,2 ponto percentual. “Quase 1/7 do que nosso país produz vai para pagar salários, benefícios e encargos da máquina”, destaca.

O documento compara a proporção dos gastos com servidores em relação a outros países. A União Europeia, informa, gasta 9,9% do PIB com funcionários públicos. O Reino Unido gasta 8,9%. Os Estados Unidos, 9,5%. O Canadá, 12,4%. Economias mais próximas com a brasileira, como México e Colômbia, desembolsam 8,4% e 7,3%, respectivamente. “A despesa tem crescido a um ritmo forte (de 2012-18, média de 0,23 p.p. ao ano) e distante tanto de países-referência (Inglaterra e Canadá) quanto de países em desenvolvimento (México e Colômbia)”, destaca um trecho do diagnóstico.

Ao destrinchar o primeiro desafio, relativo à capacidade de investimento, o Ministério da Economia sustenta que a curva de gastos reais — ou seja, já descontada a inflação — com a folha de pagamentos de empresas públicas federais saltou de cerca de R$ 237 bilhões em 2003 para aproximadamente R$ 350 bilhões em 2018. Os investimentos, por sinal, subiram de R$ 50 bilhões para pouco mais de R$ 100 bilhões, de uma diferença de R$ 187 bilhões no início da curva para R$ 277 bilhões. “O forte crescimento dos gastos obrigatórios comprometeu a capacidade de investimento do Estado brasileiro. São menos obras de saneamento básico, menos estradas e pontes, menos saúde e educação”, sustenta um trecho.

Na exposição de motivos do desafio seguinte, o governo informa que a força de trabalho na administração pública federal saltou de 532 mil servidores, em 2003, para 712 mil, em 2018, o equivalente a um aumento de 34%. Nesse período, ressalta que a despesa com pessoal civil ativo subiu de R$ 44,8 bilhões, em 2008, para R$ 108,7 bilhões, em 2018. Uma alta de 242% no período. “Aumento da força de trabalho sem aumento correspondente na qualidade de serviço público”, destaca o documento.

O governo acrescenta que, de 1970 a 2019, a quantidade de planos e carreiras na administração pública federal subiu 319%. “Mudanças orientadas para beneficiar a própria máquina, não para melhor servir à sociedade”, sustenta um trecho. O relatório comunica, ainda, que 15,5 mil servidores cuidam da folha de pagamento em um custo de R$ 1,6 bilhão por ano. E ressalta ainda existirem funções como chaveiro, discotecário, seringueiro, detonador, operador de telex, especialista em linotipos, hialotécnico, datilógrafo e operador de videocassete.

O terceiro e último diagnóstico faz uma comparação entre o rendimento médio mensal nominal — ou seja, sem descontar a inflação — pago aos servidores ativos com trabalhadores do setor privado. Em 2002, a diferença era de R$ 2,5 mil, quando a média no setor público era de R$ 2.924, e no privado era de R$ 484. Em 2019, informa o relatório, essa diferença chegou a R$ 10 mil, com o governo pagando, em média, R$ 11.842, e as empresas, R$ 1.960.

No último slide, a equipe econômica sugere que a digitalização e a aposentadoria dos servidores reforçam a necessidade de discutir a reforma administrativa, atribuindo os fatores como uma “janela de oportunidade”. “Grande parte dos servidores se aposentará nos próximos anos, demandando replanejamento da força de trabalho”, destaca um trecho. Segundo a equipe econômica, 21% irão se aposentar até 2024. 42% se aposentarão até 2030. E 61% entrarão em inatividade até 2039.

Cautela

Do ponto de vista político, a reforma administrativa é tratada com cautela. A Secretaria de Governo e o Ministério da Economia atuam em conjunto a fim de evitar desentendimentos ou um texto politicamente inviável. Na própria equipe econômica, o tema é tratado comedidamente. “Tem muito atrito em aberto na Câmara e no Senado, e não estamos falando só de instrumentos da articulação política. Há muitas frentes abertas. Há um receio do governo em criar mais atritos do que soluções”, destacou um interlocutor.

Diante das resistências, Bolsonaro quer dar a palavra final. Vai ouvir Guedes, mas deixará claro que não quer uma reforma dura demais com os servidores. “Amanhã (nesta terça-feira — 19/11) tenho reunião cedo. A previsão, a previsão, pode ser que entregue amanhã para eu dar uma olhada. Conversei com o Paulo Guedes à tarde de novo. Quero mandar uma proposta a mais suave possível. Essa que é a ideia”, afirmou. Na manhã desta segunda-feira (18/11), disse que ela está no “forno”. “Está no forno, pô. Para que tanta pressa? Não tô entendendo. Tem que mandar para lá para ter menos atrito possível. É só isso”, acrescentou. 


Fonte: Correio Braziliense