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Investigação mostra envolvimento de Titon na Operação Fundo do Poço

Fotos, ligações e mensagens estão em relatório do Gaeco

O nome do deputado estadual Romildo Titon (PMDB) aparece 881 vezes no relatório final de investigação policial encaminhado pelo MP (Ministério Público) ao TJ 
(Tribunal de Justiça). Em 671 páginas, a investigação do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado) apresentou cópias de ligações telefônicas, trocas de mensagens de texto, além de fotos, as quais o Notícias do Dia teve acesso. O material revela a proximidade do atual presidente da Alesc (Assembleia Legislativa de Santa Catarina) com os empresários considerados os chefes das organizações criminosas que cometeram irregularidades na perfuração de poços artesianos em 17 municípios das regiões Oeste, Meio-Oeste e Serrana de Santa Catarina, além de municípios do Paraná. 

A Operação Fundo do Poço foi deflagrada pelo MP em novembro de 2013, após cerca de um ano de investigações. As irregularidades envolveram contratos de R$ 4,9 milhões. Deste valor, R$ 813 mil foram solicitados ou prometidos a título de propina e pelo menos R$ 500 mil foram efetivamente pagos. Além de Titon, foram denunciados o secretário de Desenvolvimento Regional de Campos Novos, Luiz Antônio Zanchett, os prefeitos Inês Terezinha Pegoraro Schons, de Celso Ramos, Lucimar Salmória, de Abdon Batista e Walter Kleber Kucher Júnior, de Erval Velho, os vice-prefeitos Fernando Mocelinm, de Abdon Batista e Valmor Pedro Bacca, de Peritiba. Ainda, mais 15 servidores ou ex-servidores públicos, oito funcionários de empresas, nove empresários e um advogado também foram indiciados. Os empresários Miguel Atílio Roani e Luciano Dal Pizzol foram indiciados e permanecem presos. Sobre os acusados pesam denúncias de corrupção passiva e ativa, peculato, que é o desvio de dinheiro público e organização criminosa, entre outros.

Além dos indícios já consolidados, no dia 4 de fevereiro o relator do caso no TJ, desembargador José Trindade dos Santos aceitou o pedido do MP para continuar a investigação. Existem provas de que houve a prática de outros crimes em cerca de 80 municípios. O magistrado autorizou que os dados sejam compartilhados e individualizados para cada uma das promotorias de Justiça que têm jurisdição sobre as cidades com contratos sob suspeita. Para Trindade dos Santos, os 80 volumes de documentos e mais de um ano de interceptações telefônicas podem demonstrar "ramificações criminosas" e crimes já cometidos nos outros municípios citados na denúncia entregue ao TJ em dezembro de 2013.

Além de R$ 60 mil e da promessa de construção de um poço artesiano em seu sítio, no valor de R$ 275 mil, segundo o inquérito criminal, o deputado Romildo Titon teria recebido mais R$ 10 mil após conseguir recursos para novas escavações no município de Ouro, no Meio-Oeste catarinense. Segundo os áudios e os documentos anexados à denúncia, Titon passou, desde 2012, a fazer "veementes esforços" para patrocinar os interesses das empresas de perfuração de poços artesianos junto às autoridades, visando alterar as normas ambientais para facilitar ainda mais a atuação dos dois grupos e em "detrimento do meio ambiente".

O deputado estadual Romildo Titon nega fraude em licitação e cobrança de propina. Admite apenas que pediu doação para campanha de correligionários, nas eleições de 2012.

Fotos registram reunião em empresa 

A proximidade entre o deputado Romildo Titon (PMDB) e o empresário Luciano Dal Pizzol é destacada no relatório, que apresenta fotos de encontros entre ambos na sede da empresa Água Azul, registrado com fotos nas páginas 261, 262 e 263. Duas conversas que confirmam a reunião também estão inclusas no relatório.

02/05/2013 - 15:32:29 - Duração: 00:00:45

RESUMO: Titon liga para Luciano e pergunta ao mesmo se este vai estar amanhã de manhã na empresa. Luciano confirma que sim. Titon diz a Luciano que amanhã as 8h30 estará aí (Empresa Água Azul) para falar com o mesmo. Luciano diz que estará esperando. Titon diz para Luciano arrumar tudo "aquelas coisaradas lá, que nós conversamos". Luciano concorda e diz "Beleza, Até amanhã de manhã". Titon confirma novamente que oito e meia da manhã estará aí (Empresa de Luciano em Videira). Despedem-se.

03/05/2013 - 08:40:35 - Duração 00:01:07

RESUMO: Interlocutora liga para Luciano e diz que o deputado está aqui (empresa de Luciano). Luciano diz que já está chegando.

E ainda, confirmando a relação de proximidade entre LUCIANO e TITON de que estão previamente ajustados, convém ressaltar que no dia 17/05/2013 os aludidos demandados voltaram a manter encontro na cidade de Videira/SC, conforme constatado em diligência policial realizada, "in loco", por este Grupo de Atuação Especial de Combate as Organizações Criminosas. Denota-se de forma inconteste que o parlamentar TITON é peça fundamental para os negócios dos empresários investigados.

Em ligação, empresário oferece R$ 20 mil 

A relação do deputado estadual Romildo Titon (PMDB) com o empresário Miguel Atílio Roani, dono da Hidroani Poços Artesianos Ltda. e também denunciado pelo Ministério Público é tratada no capítulo intitulado "Das situações obscuras e não esclarecidas atreladas ao provável repasse de valores de origem duvidosa".

Assim como em relação ao empresário Luciano Dal Pizzol, conversações "carregadas de conteúdo suspeito" foram interceptadas judicialmente e "sugerem a alta probabilidade de repasse de dinheiro de origem duvidosa" a Titon por parte de Roani.

17/09/2012 - 09:20:44 - Duração: 00:01:18

Titon - Alô.
Masculino não identificado - Titon, só um minutinho.
Titon - Tá.
Miguel - Titon.
Titon- Oi.
Miguel - Titon é o Roani, tudo bom?
Titon - Tudo bem e o amigo?
Miguel - Tudo joia, eu tenho aquilo lá, eu tô subindo agora, acho que amanhã vou para Abdon [Batista] e gostaria de te localizar num lugar para te entregar.
Titon - Mas hoje ou amanhã?
Miguel - Amanhã, hoje eu não consigo.
Titon - Não, amanhã eu tô lá na cidade, de manhã [Campos Novos].
Miguel - Tá na cidade? Então beleza eu vou sair cedo tá, e primeiro eu tenho que falar com o ABELHA [prefeito de Abdon Batista] e se não de repente eu falo pra você e dai nós se achemos no trevão.
Titon - Ah tranquilo, tranquilo, eu estou até o meio-dia lá na cidade, qualquer hora não tem problema.
Miguel- Então beleza.
Titon - Só depois do meio-dia.
Miguel - EU QUERO QUE TU CONTE COM UM VALOR POR ENQUANTO, 20.000 TÁ?
Titon- Tá bom.
Miguel - Tu entendeu né?
Titon - Beleza.
Miguel - Porque, me atrasou umas coisas, mas eu vou ver se eu consigo para esses dias tá.
Titon - Não, tranquilo, não te preocupe.
Miguel - Beleza então.
Ainda de forma a reiterar a expectativa de pagamento de valores ao deputado estadual TITON, cumpre trazer à colação o diálogo entre o investigado MIGUEL e o interlocutor identificado como sendo CLAUDEMIR CAMILO BEE, que naquela ocasião era candidato a vereador do município de Concórdia. MIGUEL é taxativo ao asseverar o repasse de dinheiro

18/09/2012 - 19:35:32 - Duração: 00:07:08

RESUMO: Miguel liga para Bee [Clademir Camilo Bee é servidor público municipal. Exerceu por grande período de tempo atividade junto ao PROCON Concórdia e atualmente é candidato a vereador da cidade].

Sendo que a partir deste minuto Miguel diz que amanhã irá deixar o telefone celular com a Cristiane (filha de Miguel) e que tinha marcado hoje com o Titon e deu problema em uma máquina e amanhã estará com ele e que esta semana adiou a semana inteira de falar com ele e já falou com ele e terá que levar uma grana para ele e ele que vai distribuir e, ele [Titon], não disse onde vai distribuir e diz ao interlocutor que vai levantar o seu [nome de Bee] nome na frente dele [Titon] e em seguida Miguel pergunta a Bee se este já falou com Titon. Bee diz que não falou e segue a conversa sobre o processo eleitoral até por volta 4:30. Por volta do minuto 4:30 Miguel diz que falou com Martine e que este falou sobre combustível e ressalta que já falou com Titon e seguem falando sobre a campanha eleitoral até o fim da chamada, que é interrompida repentinamente. 

Entrevista 

Em entrevista ao Notícias do Dia, o presidente da Assembleia Legislativa nega que tenha qualquer envolvimento com as fraudes denunciadas pelo Ministério Público. Romildo Titon (PMDB) disse que, em depoimento, esclareceu que pediu aos dois empresários denunciados doações para campanhas eleitorais. Sobre o diálogo registrado pelo Gaeco em 17 de setembro de 2012, no qual Atílio Roani fala que ele poderia contar com R$ 20 mil seria apenas uma contribuição eleitoral e não propina como afirmam os promotores na denúncia entregue ao Tribunal de Justiça.

Existem questões pontuais na denúncia e nas provas. A primeira é o inquérito que mostra que o senhor tem uma relação muito próxima com os dois empresários acusados de chefiarem esse esquema fraudes em obras de poços artesianos em 17 municípios. Como é sua relação com essas pessoas, Miguel Atílio Roani e Luciano Dal Pizzol?

Igual a qualquer outro empresário da minha região que eu conheço.

E essas conversas em que o senhor aparece falando ao telefone com eles, trocando mensagens por celular e indo ao escritório de um deles e recebendo um dos empresários em seu gabinete em Videira? Quais são as motivações dessas conversas? Elas não têm relação nenhuma com as fraudes?

Nenhuma. Eu desafio qualquer um que prove que eu tenho relação com fraudes em licitação. Não tem uma ligação que fale em fraude em licitação. Você deve ter escutado as fitas e deve saber. Não tem nenhuma que envolva meu nome.

Tem uma mensagem que o senhor trocou com Luciano Dal Pizzol em que o senhor fala em orçamentos. O que são estes orçamentos?

Eu sempre trabalhei com poços artesianos comunitários. A sociedade inteira sabe na região onde tem problema de estiagem e falta de água e eu sempre fiz isso através de associações de moradores. Por isso a minha frequência em pedir a ele orçamentos. Eu não tenho como discutir com a sociedade se eu não tiver um orçamento.

E o que o senhor pode dizer sobre os recursos que o senhor conseguiu para as obras que teriam sido fraudadas, segundo o MP-SC?

Estão querendo misturar e trazer algo que aconteceu na campanha de 2012 que não tem nada a ver com a história. Esta lá no meu depoimento, não precisou ninguém pedir. Eu falei que pedi uma contribuição de campanha para o Luciano [Dal Pizzol]. E que não foi entregue. Não tem nada a ver com licitação e com subvenção.

E sobre o diálogo que o Miguel Atílio Roani fala que o senhor poderia contam com R$ 20 mil?

Também está no meu depoimento, não é novo. Também solicitei a ele uma doação de campanha para um determinado candidato. Uma doação de campanha e foi na véspera da eleição de 2012. É má fé do Mistério Público.

Então o senhor nunca conseguiu recursos do Estado para essas obras em municípios que estão sob investigação?

Consegui muito dinheiro para a região, mas nada que venha a envolver essa questão.

Além de conseguir os recursos, o MP-SC diz que o senhor interferia diretamente na execução dessas obras direcionando as licitações para esses dois grupos empresariais?

Uma coisa é a suposição do Ministério Público. Não existe qualquer convênio que me relacione e eu desafio a provarem isso.

E essa promessa de poço artesiano na sua propriedade?

É mentira do Ministério Público e não nenhum momento que provem que eu pedi poço artesiano.

CONTRAPONTO 

A reportagem do Notícias do Dia tentou contato com os citados pelas investigações. Evandro Carlos dos Santos não é mais diretor e funcionário da Alesc (Assembleia Legislativa) e não foi encontrado para comentar as denúncias. O advogado do empresário Miguel Atílio Roani, Eduardo Bernardi, estava com o celular desligado. Em contato com o escritório do advogado, a secretária informou que Bernardi está viajando. O advogado do empresário Luciano Dal Pizzol, Fernando de Marco, e o prefeito de Ouro, Neri Miqueloto, também estavam com os celulares desligados e não retornaram as ligações até o fechamento desta reportagem.


Fonte: Fernando Mendes/Arquivo/ND